Louco ou sonhador visionário? De qual lugar o engenhoso fidalgo cervantino fala ao mundo? Nesse país em que a intolerância maniqueísta e fundamentalista avança a largos passos, por que não podemos colocar em cheque esse aparente paradoxo que atravessa gerações? Só é possível ser petralha ou coxinha? Machista ou feminazi? Iphone ou Galaxy? Carnívoro ou vegano?
Quem disse que não há sonhadores visionários que são loucos?
Há sim. E o digo com conhecimento de causa. Na margem do Brasil profundo, na periferia de Aracaju, no bairro do Bugio, um grupo de lunáticos tocam diariamente sua fábrica de sonhos impossíveis: construíram com as próprias mãos um galpão; ampliaram esse galpão, subindo um segundo pavimento; fazem um festival; desenvolvem atividades formativas que apresentam o teatro a jovens do bairro e da cidade; e, principalmente, mantém bravamente um grupo de teatro em atividade há mais de uma década.
Certo dia me procuraram com uma insana proposta de levantar um Quixote, a sua mais perfeita tradução. Dentre as idas e vindas nessa ponte aérea Natal-Aracaju, esses quatro cavaleiros da desrazão (e sua fiel escudeira) trabalharam incansavelmente, levantaram material suficiente para montar cinco, seis espetáculos, propuseram, construíram, desconstruíram. E entre as minhas intervenções para organizar o que tínhamos, surgiram outros Quixotes igualmente delirantes, dispostos a encarar essa empreitada: César Ferrario, transformando o caos em palavras; Helder Vasconcelos, botando fogo nesses corpos; Esio Magalhães, trazendo a precisão e o jogo da máscara; João Marcelino, transformando a cena em lirismo visual; Paula Queiroz, dando limpeza e sentido para o trabalho de cada um; Célia Navarro, o olhar responsável sobre a nossa irresponsabilidade; e Gabi Etinger, transpondo a cena em poesia bidimensional. Gente de cinco estados e um sonho comum.
E agora os cavaleiros precisam partir para sua desvairada missão de mudar o mundo! Vejam, já partiram! Partindo estão! Por isso, não duvidem desses loucos!

​

Fernando Yamamoto